Charles Jourdan e o Epítome do Swell.
Eu devia ter nove anos quando eles me chamaram a atenção pela primeira vez. Foi no tempo em que os pais não tinham medo de deixar os filhos andar pelas ruas de Nova Iorque. Eu era alto para a minha idade, com a mesma altura que tenho agora (que 50 anos depois não é considerada alta de todo), mas para um miúdo de nove anos era bastante alto.
Eu sabia mover-me como um nova-iorquino. Com objetivo, determinado, sem hesitações. Nunca caminhei muito para além da 5ª Avenida e sabia apanhar o autocarro para casa, que me levava diretamente à minha porta. Estas viagens terminavam frequentemente na Saks. O seu departamento de calçado era vasto e povoado por funcionários graciosos que falavam com vozes murmuradas. A secção de calçado da Bergdorf’s também era bastante agradável, na verdade. Mas foi na Saks que vi o meu primeiro par de Charles Jourdan. Havia também uma loja com o mesmo nome, com um interior elegante em preto e vermelho. Na altura, era demasiado sofisticada e assustadora para entrar. Mas na Saks, podia pegar neles, segurá-los e tocar no interior suave e elegante. É lindo.
Havia sandálias e pumps, ou court shoes, como os ingleses gostam de dizer. Havia mules e brogues, botas feitas de cetim ou, por vezes, de uma misteriosa pele texturada. Enquanto crescia, espiava um par aqui, ou estudava-o numa loja de departamentos ali. Se experimentasse o sapato, ele enrolava-se à volta do pé, segurando-o, e o seu tornozelo parecia mais alinhado com o momento em que a Cinderela calça o sapatinho de cristal do que com qualquer outra coisa.
Devo acrescentar aqui que não tenho um fetiche por pés, nem nunca caí na toca do coelho que é Louboutin ou Gucci ou Ferragamo. Mas Charles Jourdan era especial. Comprar sapatos – não o faço agora, não da forma como o fazia na altura – era a expressão máxima do prazer sensorial. A caixa é fácil de segurar e se o sapato lhe servir mesmo, tudo se torna possível. Estes sapatos eram amados por Diana Spencer e Imelda Marcos, e essas raparigas podiam ter qualquer par de sapatos que quisessem. Eram amados até por almas desprezíveis como eu.
Naqueles dias inebriantes, maravilhosos, em que adorava sapatos, andava pelas ruas da cidade para estudar como é que uma pessoa se calçava. Agora toda a gente usa ténis. É ótimo para dar os seus passos, mas a única pessoa que fica elegante com eles é…